21.1.19

o pai da noiva

A noiva sempre sonhou em se casar. Quando o noivo fez o pedido, começou imediatamente a planejar os detalhes da cerimônia. Na verdade, a rever cada detalhe porque já tinha tudo planejado há anos. A noiva assinava revistas de festas de casamentos, estava atualizada com as tendências da moda, conhecia os melhores doceiros, estilistas, maquiadores. Já sabia qual ia ser o modelo do vestido, já tinha decidido o recheio do bolo, as flores da igreja, os dizeres do convite. Faltava só executar. A noiva cuidou pessoalmente de cada etapa, embora tenha contratado a melhor cerimonialista da cidade. O seu ia ser o casamento do ano, de arromba, impecável. A noiva se preparou para o grande dia no melhor hotel da cidade, sendo paparicada de todas formas com massagem, meditação, ofurô, pacote completo. Quando estava quase pronta, mandou avisar que o pai podia vir. Queria chegar na igreja pontualmente quinze minutos depois do horário marcado. O pai não demorou a chegar, animadíssimo, ostentando cabelos negros que tinha pintado especialmente para ocasião. A noiva quando viu teve um ataque. Todo mundo sabia que o pai tinha a cabeça mais do que branca, não tinha cabimento pintar os cabelos bem no dia do casamento. O que ele pretendia com aquilo? Roubar a atenção dos convidados, ser o assunto da noite? O pai disse que não, que só queria ficar mais bonito para o casamento, mas a noiva não quis conversa. Tinha sonhado demais com aquele momento, tinha visualizado a entrada na igreja um milhão de vezes e em nenhuma delas o pai tinha os cabelos pretos. Ainda mais um preto daqueles, quase azul. A mãe ainda tentou contornar. O cabelo do seu pai é tão pouco, minha filha, preto ou branco ninguém nem vê. Não adiantou, a noiva bateu pé. Ou o pai despintava os cabelos, ou ela não entrava na igreja com ele. O pai não estava disposto a ceder. Não tinha paciência para chiliques e estava mais do que satisfeito com seus cabelos novos. Na verdade, mesmo se quisesse colaborar, não haveria tempo pra nada àquela altura. A noiva, já um tanto desequilibrada, apesar dos exercícios de relaxamento e concentração feitos ao longo do dia, começou a pensar num substituto, porque com o pai naquele estado não entrava. Considerou todas as opções, irmão, tio, melhor amigo, mas acabou desistindo. Noiva entra com o pai, é a regra. Quando já estavam vinte minutos atrasados, a noiva afinal se conformou. Ia ter mesmo que entrar com a graúna ambulante e torcer pros convidados esquecerem a cena, deslumbrados com a cerimônia e a recepção. As fotos seriam photoshopadas e a posteridade ia guardar a imagem do pai como ele era, um distinto senhor de cabelos ralos e brancos. Pensando assim, conseguiu entrar no carro, mas passou o caminho pra igreja chorando de raiva, isso não tinha como controlar. Já com quarenta minutos de atraso e o rosto um pouco inchado, a noiva finalmente chegou. As portas da igreja se abriram, a marcha nupcial tocou e os convidados se levantaram, na expectativa. A noiva fez sua entrada aos prantos, sem conseguir pensar em nada a não ser nos cabelos do pai. O pai entrou orgulhosíssimo, também pensando só em seus cabelos novos. Foi uma comoção, uma chuva de aplausos, lágrimas e flashs.  Coisa bonita que é ver pai e noiva entrando assim, tão emocionados com aquele momento especial.

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