26.6.14

vovó e a pornografia

A revista chega e a neta corre pra ler. Tarde demais, Vovó chega antes. Que revista é essa? Photo, uma revista francesa de fotografia. Posso ver? Não que Vovó se interesse por fotografia, absolutamente. É mais uma questão de curiosidade em estado avançado mesmo. Toma, Vovó, pode ler. Mas essa revista é pornográfica! Claro que não, Vovó! Mas tá cheio de gente pelada! Isso é nu artístico, Vovó. Artístico nada, é uma pouca-vergonha! Nunca pensei que neta minha pudesse ler uma coisa assim. Não foi assim que seu pai te criou! Pois saiba, Vovó, que meu pai sempre leu essa revista, fazia até coleção. O golpe é duro demais. Vovó arregala os olhos, cambaleia, quase cai. Vai ter um troço, a neta se procupa, pra que fui falar? Vovó balança a cabeca, recusa-se a acreditar. O seu pai, não, o seu pai não lia isso! Lia, Vovó, não perdia uma. Essa revista é um clássico da fotografia. Pois pra mim é puro lixo! Os dois caíram muito no meu conceito, diz, atirando a revista no chão e retirando-se, ainda zonza. Aí, é a vez da neta entrar em choque. Em página dupla, uma fileira de homens pelados exibe-se pra câmera, numa variedade de cores, formas e tamanhos capaz de fazer corar a mais desavergonhada das mulheres, o que certamente não é o caso da Vovó. Até a neta, de renomada sem-vergonhice, se abala. A revista realmente extrapolou todos os limites da decência. Não chega a ser pornografia, mas de artístico aquilo ali não tem nada. A revolta da Vovó é mais do que justa, a neta admite. Em solidariedade, decide nunca mais ler a revista. Vai só empilhando quando as novas chegam, sem nem abrir. Já Vovó, dizem, de vez em quando dá umas folheadas.