14.1.07

conference call

O senhor, aflito, telefona para avisar que minha avó está passando mal. Posso falar com ela, senhor? Não, ela não está em condições de falar. Tudo bem, estou indo aí. Qual o nome da rua? Não sei. É só ler a placa, senhor. É que daqui não dá pra ler. Pergunte a um passante, então. É que não tem ninguém aqui. Antes que eu dissesse mais alguma coisa, perdeu a paciência e desligou. Lamentei não ter agradecido o amparo a vovó numa rua deserta e sem nome, mas pra minha sorte ele ligou de novo em seguida. Dessa vez, socorrendo titio. Mamãe atendeu e mostrou-se preocupadíssima com o irmão que nunca teve. Quis falar com ele, saber onde estava, tudo mais. O gentil senhor, com toda razão, novamente se impacientou e, aos berros, anunciou o sequestro. Disse que ia picar, cozinhar, fazer todo tipo de delírio gastronômico com titio se não recebesse o resgate. Do meu lugar dava pra ouvir o que dizia e fiquei bastante preocupada. Tendo ou não tio, é sempre assustador saber que a vida dele está entre um ensopado e um estrogonofe. Mamãe também se apavorou. Gritou e implorou pelo irmão até começar a escorregar da cadeira e se espatifar, revirando os olhinhos. Ela para um lado, o telefone para o outro. Não entendi na hora por que mamãe tinha jogado nosso telefone novinho no chão, mas soube depois que era para o senhor ouvir o barulho e perceber que ela estava mesmo tendo um ataque. O que pretendia estatelada no chão, no entanto, nunca compreendi, já que não estávamos numa conference call. Mas que diferença isso faz quando se tem uma avó e um tio sequestrados e uma mãe infartada?

9 comentários:

Anônimo disse...

Quem me dera ser sua mãe só para ser sua musa! Nesta minha nova fase de estrear os comentários,estou adorando ser a primeira (notou?) a dar os parabéns pelas novas crias. Você se supera a cada crônica, menina.

Anônimo disse...

Um registro tão fiel do cotidiano carioca já ultrapassa o domínio da mera ficção. Estamos diante do faro indiscutível de uma escritora que desponta inteira para o bem-estar gozozo de mães reais ou virtuais. Vai em frente, menina!

Anônimo disse...

sensacional!!

Anônimo disse...

É verdade, sensacional!

Anônimo disse...

ADOREI! Estou defendendo uma divulgação de determinados textos pra mais gente, mas a "blogger" está se dizendo tímida...

Anônimo disse...

A noiva fazendo cerimônia justo após o casamento...

Anônimo disse...

pobre menina, um dia ela ainda entende essa mae..

Mariana disse...

mãe não dá pra entender, não.

Anônimo disse...

dah sim, eh q vc ainda eh mto jovem, qse como a menina...